quinta-feira, 22 de janeiro de 2009

Num dia histórico, Corumbá se uniu à indignação internacional para manifestar sua solidariedade às vítimas dos carniceiros de Gaza

No mesmo dia em que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi hipotecar seu apoio às reformas promovidas por seu colega boliviano, o presidente Evo Morales, na localidade fronteiriça de Arroyo Concepción (distante cinco quilômetros do perímetro urbano de Corumbá) – que, no fatídico mês de maio de 2008, fora palco da intolerância de uma bizarra (sic) juventude cruceñista com indisfarçável vocação nazi-fascista –, o coração do Pantanal se somou à corrente solidária internacional, ao som de Joan Baez, Ivan Lins, Mercedes Sosa, Milton Nascimento, Elis Regina, Ney Matogrosso, Clara Nunes, Geraldo Vandré, Beth Carvalho e Chico Buarque. A mesma indignação contra mais um massacre ao povo palestino, manifestada pelos dois mandatários horas antes no palanque montado à beira da futura rodovia Corumbá – Santa Cruz (em vias de ser concluída pelo governo boliviano, com o indispensável apoio do governo brasileiro), aproximadamente três centenas de cidadãos das mais diversas origens, classes sociais, etnias, profissões, credos e nacionalidades participaram irmanados na esperança de ver triunfar a justiça para assegurar a tão sonhada paz duradoura na região que considerada berço da humanidade.
Apesar do sol causticante e da temperatura beirando os quarenta graus, pouco a pouco a praça foi sendo tomada por pessoas anônimas, conhecidas e personalidades que atenderam ao convite e faziam questão de explicitar sua solidariedade às vítimas da prepotência que hoje atende pelo binômio Bush - Peres. A comerciária Fernanda Taques, sobrinha do incansável jornalista Luiz Taques (detentor de dois invejáveis prêmios no campo dos direitos humanos), foi das primeiras a chegar e fez questão de vestir uma camiseta de sua denominação religiosa, a Primeira Igreja Batista de Corumbá. Do alto de seus bem vividos setenta e cinco anos, o vendedor ambulante Raimundo Nonato dedicou sua tarde à prática da cidadania, explicando que, como filho de retirante nordestino chegado na década de 1950 ao então próspero entreposto comercial do Prata, não poderia se furtar a manifestar sua indignação contra o absurdo de ver uma nova versão do pequeno Davi contra o gigante Golias, num papel inversamente protagonizado pelos que, quando menino, eram mostrados como vítimas do nazismo que tomara conta de boa parte da Europa. Com essa mesma sabedoria e discrição, o Padre Pascoal Forin, vigário da Paróquia de São João Bosco e coordenador do Pacto Pela Cidadania e do Comitê de Corumbá e Ladário da Ação da Cidadania contra a Fome, a Miséria e pela Vida, deu sua generosa participação, durante o breve momento em que uma leve garoa refrescou os manifestantes como que a natureza também deixasse seu tributo àquela ação cidadã – uma bênção divina, nas sábias palavras do querido sacerdote salesiano oriundo do norte da Itália.
Militante do movimento negro e dirigente carnavalesco, Edimir Abelha Moraes, irmão do reconhecido jornalista Edson Moraes (protagonista de memoráveis reportagens-denúncia contra a tortura em plena ditadura), não só fez questão de ajudar na organização como arregimentou companheiros do movimento social, como dirigentes comunitários e membros de religiões de matriz africana. Por seu turno, o presidente do Centro Boliviano-Brasileiro Trinta de Março, Andrés Menacho, desdobrou-se entre a mobilização de seus conterrâneos para a recepção ao presidente Evo Morales e a distribuição de correspondência às autoridades de seu país para participar-lhes da mobilização em solidariedade às vítimas do massacre de Gaza. Sem qualquer constrangimento, para Menacho, a menção feita pelos dois presidentes ao drama do povo palestino tem a ver com o seu trabalho de beija-flor. Dirigente histórico do PT em Corumbá, o ativista cultural e filho de pais bolivianos Arturo Castedo Ardaya justificou a postura clara de seu partido em favor do povo palestino e contra todas as formas de opressão. Também descendente de boliviano, o professor e dirigente sindical Marco Antônio Monje dedicou sua visita à sua terra para ajudar na organização da manifestação e a organização junto aos meios de comunicação da capital do estado, deixando clara a posição de seu partido, o PSTU, que dedicou o programa nacional ao povo palestino – não sem cobrar dos governos latino-americanos posições como a dos presidentes Evo Morales e Hugo Chávez. Quanto ao PSOL, cujo dirigente local, Anísio Guilherme da Fonseca, sindicalista ferroviário e graduando em geografia, é da etnia guató – o povo canoeiro do Pantanal –, encarregou-se de levar a solidariedade no papel de quem já provar sua origem, como de seu povo, que passou décadas a fio para convencer a FUNAI nos tempos da ditadura para desmentir que se tratava de uma etnia extinta por decreto. Os legislativos de Corumbá e de Ladário se fizeram representar à altura, com pronunciamentos dignos de reconhecimento público. Coube ao recém-empossado prefeito de Ladário, professor José Antônio Assad e Faria, encerrar o ato público, de modo didático e esclarecedor: explicou o drama humano da população de Gaza ao comparar as dimensões de seu território às de seu município, observando que sua população é o dobro da população de Campo Grande, capital de Mato Grosso do Sul – além de contextualizar o valor da cultura árabe e suas generosas contribuições no campo das ciências, das artes, das letras e sobretudo da paz, como descendente de árabe que é. O prefeito Ruiter Cunha de Oliveira, de Corumbá, foi representado pelo secretário Carlos Porto, ligado aos movimentos populares, em cuja fala justificou sua ausência por haver acompanhado as comitivas presidenciais ao aeroporto.
Há que se observar que o comércio local deu uma prova inequívoca de solidariedade, tendo fechado as portas em respeito ao ato público, com a afixação de cartazes e faixas pretas em sinal de luto pelo milhar de mártires que, dia após dia, não pára de crescer. Desde a pioneira passeata em memória dos mártires de Sabra e Chatila (de 1982), em torno de 15 manifestações públicas já foram realizadas no contexto do genocídio palestino, libanês e iraquiano, mas é indiscutível o nível de engajamento tão diverso e eclético como o da passeata do dia 15 (ainda que outras já tenham mobilizado um número maior de participantes). E queridos Companheiros de solidariedade, durante esta mobilização, foram sendo lembrados – tais como o historiador Valmir Batista Corrêa (autor, como vereador na década de 1980, da lei municipal que instituiu o Dia Municipal de Solidariedade ao Povo Palestino, observado em 29 de novembro, a exemplo da resolução da ONU com mesmo objetivo), o internacionalista recifense Miguel Anacleto Júnior (fundador do IBASP e membro-correspondente do Comitê de Solidariedade ao Povo Palestino de Corumbá, fundado em 27 de novembro de 1987), o ex-dirigente sindical ferroviário Manoel do Carmo Vitório (o primeiro coordenador do Comitê de Solidariedade por diversos anos), a biblioteconomista e professora universitária Lena Mello (competente organizadora da Primeira Mostra da Cultura Árabe, que perdurou por longos quatro meses no interior da Biblioteca Estadual da Casa de Cultura de Corumbá, entre julho e novembro de 1987) e o sociólogo Lejeune Mirhan Xavier (contemporâneo de movimento estudantil, inclusive na mobilização para o Congresso de Reconstrução da UNE em 1979, em Salvador, o primeiro posterior à repressão do de Ibiúna, interior de São Paulo – cuja linguagem contundente, na época, por meio de uma carta enviada desde Campinas, provocou um mal-entendido entre alguns dirigentes estudantis sul-mato-grossenses, supostamente melindrados com risco iminente de delações e atos de provocação, afinal a aterradora sombra do Cabo Anselmo e outros do gênero ainda pairava na memória coletiva da juventude politizada de então).
Já foi dito, algum tempo atrás, que a dimensão da dignidade de um povo é aquilatada pelo seu nível de autodeterminação. O coração do Pantanal, pois, mais uma vez respondeu à altura de seu cosmopolitismo centenário. Sem risco de incorrer em qualquer leviandade, pôde-se constatar que na manifestação do dia 15 em Corumbá não faltou ninguém – respeitando e lamentando a ausência involuntária dos que não tiveram condições de participar “de corpo presente”, mas que estavam representados pelos participantes. Obviamente, não dá para não mencionar, ainda que brevemente, como reconhecimento público, o(a)s incansáveis militantes da causa palestina de todos os tempos em Corumbá: Omar Fares, Adnan Haymour, Nasser Safa Ahmad, Riad Ale Hamie, Said Mohamad Said, Nail Abdel, Nidal Mohamad, Murad Abdel, Monder Safa, Yahya Mohamad Omar, Antar Mohamad, Zacaria Yahya Omar, Ziad Ibrahim, Ale Hamie, Ahmad Saleh, Najeh Mustafá, Ahmad Hamie e Mohamad Garib (residentes em Corumbá); Nasser Rachid, Jadalah Safa, Rauhi Murra, Juma Rachid, Abla Issa, Yasser Rachid, Kaplan Hamdan, Taha Omar e Fátima Rachid (residentes em outras cidades); Mohamad Said, Soubhi Issa Ahmad, Mahoma Hossen Schabib e Luiz Khamis (falecidos).
Assim reza o poema-canção de Pablo Milanês (em versão para o português de Chico Buarque): “A história é um carro alegre, cheio de povo contente, que atropela indiferente aquele que tentar impedi-lo... O que brilha com luz própria ninguém o pode apagar, seu brilho pode alcançar a escuridão de outras coisas...”
Para concluir, a consigna do Comitê de Solidariedade ao Povo Palestino de Corumbá (adotada em 1987), com base numa obra exposta na Primeira Mostra da Cultura Árabe de Corumbá (atual como nunca), uma das palavras-de-ordem na passeata do dia 15: A paz mundial começa na Palestina!
Ahmad Schabib Hany
Pelo fim do massacre em Gaza!
A humanidade vem testemunhando com perplexidade a guerra de extermínio contra a população de Gaza (Palestina ocupada), diante da covarde omissão dos organismos internacionais, incondicionalmente ao lado dos poderosos interesses da indústria de armas e do petróleo e seus tentáculos pelo mundo.
O governo dos Estados Unidos e seus aliados fazem de conta que advertem o covarde governo de Israel, que usa as mais modernas armas militares contra uma população indefesa que sequer pode usar velhas espingardas. Em nome de uma cínica e bizarra segurança interna violam convenções internacionais e resoluções das Nações Unidas, sem qualquer sinal de retaliação do Conselho de Segurança – aliás, seu maior aliado desde a criação da ONU, em 1945 (tanto é que três anos depois dividiram a Palestina milenar e propiciaram condições políticas apenas para instalar o Estado de Israel, em detrimento dos direitos do povo palestino, condenado a viver como párias em sua própria terra). Por muito menos, o Iraque e o Líbano foram destruídos pelas descomunais tropas assassinas de George Bush, misto de Hitler e Pinochet a serviço da intolerância.
Em respeito aos mais elementares direitos humanos (nunca observados para a população palestina) e aos mais altos valores éticos construídos ao longo de milênios pela espécie humana, unimos nossa voz e nossa indignação pelo imediato cessar-fogo em toda a região e a instalação de um tribunal internacional para julgar por crime de lesa-humanidade os criminosos de guerra Shimon Peres, George W. Bush e demais aliados. Pelo respeito à vida e à autodeterminação dos povos, com soberania e dignidade. A paz mundial começa na Palestina!
Corumbá (MS), 15 de janeiro de 2009.

COMITÊ CORUMBÁ PELA PAZ (corumbapelapaz@gmail.com) – Integrado pelas seguintes entidades: Fórum Permanente de Entidades Não Governamentais de Corumbá e Ladário – FORUMCORLAD (forumcorlad@gmail.com), Pacto Pela Cidadania – Movimento Viva Corumbá (pactopelacidadania@gmail.com), Ação da Cidadania Contra a Fome, a Miséria e Pela Vida (acaocidadaniacorlad@gmail.com), Organização de Cidadania, Cultura e Ambiente – OCCA (occapantanal@gmail.com), Centro Brasileiro-Boliviano 30 de Março (cebolbras@gmail.com), Coordenação Nacional de Lutas – CONLUTAS (www.conlutas.org.br), Instituto de Mulheres Negras do Pantanal – IMNEGRAS (imnegras@gmail.com), Associação de Moradores do Bairro Universitário (asmorbaiun@gmail.com), Associação Comunitária de Cultura e Esporte de Corumbá (accescor@gmail.com) Sociedade Beneficente Muçulmana de Corumbá – SOBEMCO (sobemco@gmail.com), Liga Árabe-Brasileira de Corumbá (liga.arabe@gmail.com) e Sociedade Árabe-Palestino-Brasileira de Corumbá (soarpalbra@gmail.com).

¡Por el fin de la masacre en Gaza!
La humanidad atestigua perpleja a la guerra de exterminio contra la población de Gaza (Palestina ocupada), ante la cobarde omisión de los organismos internacionales, incondicionalmente al lado de los poderosos intereses de la industria de armamento y del petróleo con sus tentáculos por todo el mundo.
El gobierno de los Estados Unidos y sus aliados disimulan falsas advertencias al cobarde gobierno de Israel, que usa las más modernas armas militares contra una población indefensa que ni siquiera pode usar viejas escopetas. En nombre de una cínica y bizarra seguridad interna violan convenciones internacionales y resoluciones de las Naciones Unidas, sin cualquier señal de retaliación del Consejo de Seguridad – su mayor aliado desde la creación de la ONU, el 1945 (que tres anos después dividieron la Palestina milenaria y propiciaron condiciones políticas apenas para instalar al Estado de Israel, en perjuicio de los derechos del pueblo palestino, condenado a vivir como parias en su propia tierra). Por mucho menos, el Irak y el Líbano fueron destruidos por las descomunales tropas asesinas de George Bush, mezcla de Hitler y Pinochet al servicio de la intolerancia.
En respeto a los más elementales derechos humanos (jamás observados hacia el pueblo palestino) y a los más altos valores éticos construidos a lo largo de miles de años por la especie humana, unimos nuestra voz y nuestra indignación por el inmediato cese de fuego en toda la región y la instalación de un tribunal internacional para juzgar por crimen de lesa-humanidad a los criminales de guerra Shimon Peres, George Bush y demás aliados. Por el respeto a la vida y a la autodeterminación de los pueblos, con soberanía y dignidad. ¡La paz mundial comienza en Palestina!
Corumbá (Brasil), 15 de enero de 2009.

COMITÉ CORUMBÁ POR LA PAZ (corumbapelapaz@gmail.com) – Integrado por las siguientes entidades: Fórum Permanente de Entidades Não Governamentais de Corumbá e Ladário – FORUMCORLAD (forumcorlad@gmail.com), Pacto Pela Cidadania – Movimento Viva Corumbá (pactopelacidadania@gmail.com), Ação da Cidadania Contra a Fome, a Miséria e Pela Vida (acaocidadaniacorlad@gmail.com), Organização de Cidadania, Cultura e Ambiente – OCCA (occapantanal@gmail.com), Centro Brasileiro-Boliviano 30 de Março (cebolbras@gmail.com), Coordenação Nacional de Lutas – CONLUTAS (www.conlutas.org.br), Instituto de Mulheres Negras do Pantanal – IMNEGRAS (imnegras@gmail.com), Associação de Moradores do Bairro Universitário (asmorbaiun@gmail.com), Associação Comunitária de Cultura e Esporte de Corumbá (accescor@gmail.com) Sociedade Beneficente Muçulmana de Corumbá – SOBEMCO (sobemco@gmail.com), Liga Árabe-Brasileira de Corumbá (liga.arabe@gmail.com) e Sociedade Árabe-Palestino-Brasileira de Corumbá (soarpalbra@gmail.com).

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